Proposta para o concurso de monumento no Vale do Anhangabaú, lançado para marcar os 100 anos da Semana de 22. Cem anos depois, a comemoração de um episódio contraditório, ocorre lado a lado com uma necessária revisão crítica. Os versos de Pauliceia Desvairada – lidos por Mário de Andrade no Municipal – comprovam a íntima ligação que a Semana estabeleceu com a cidade que a abrigou, esta “grande boca de mil dentes”. Desde então São Paulo, “meu querido palimpsesto sem valor”, como anota o poeta em outra passagem, desenvolveu uma sólida vocação cultural que nada deve a outras capitais do mundo. Não seria o caso de atribuir à Semana a origem direta dessa condição presente, mas chamar atenção para o fato de que em grande medida a caleidoscópica cultura urbana da cidade é de uma complexidade inestimável.
Seria um equívoco, portanto, pensar um marco como um monumento em sua forma convencional, como símbolo de poder, de memória cristalizada, ou de embalsamamento. O caráter público, coletivo, difuso e provocador da Semana (e de suas reverberações) conduz a um monumento sem base, aberto à franca interação das pessoas, capaz de assimilar a “contribuição milionária de todos os erros” – espetáculos de dança, peças de teatro, shows, manifestações artísticas, etc.
Imagina-se um prisma em concreto armado de 45 por 45 centímetros de lado por 100 metros de comprimento. Fraciona-se o mesmo em 14 partes, variando a medida entre e 14 e 4 metros. As barras daí decorrentes são, então, dispostas umas sobre as outras, conformando uma obra que se ramifica no terreno, explorando a topografia e pondo em evidência os elementos visuais do entorno (Franz Weissmann). Sua implantação revela dois vértices principais, um que aponta para a Praça das Artes e, outro, para o edifício dos Correios. Atenta-se desse modo para a reconstrução simbólica da esquina entre a avenida São João e a rua Formosa. A obra não alude a nenhyma imagem figurativa, existindo como fato estético, aberta à fruição lúdica (Lygia Clark e Hélio Oiticica). Indica-se pintar o concreto de vermelho e gravar, nos prismas maiores, versos de Pauliceia Desvairada, sublinhando seu caráter de obra concreta, pop-concreta (Augusto de Campos, Rubens Gerchman) – intenção que parecia já existir como potência naquele fevereiro de 1922.
Proposal for the Monument Competition in Vale do Anhangabaú, created to mark the 100th anniversary of the Week of 22 (Semana de 22). This landmark event, held in São Paulo in 1922, was a major cultural movement that introduced modernist ideas to Brazil, significantly impacting literature, art, and architecture. A century later, while celebrating this pivotal event, there is also a need for critical reflection. The verses from Pauliceia Desvairada, read by Mário de Andrade at the Municipal Theater, highlight the deep connection the Week established with the city, described as a “great mouth with a thousand teeth.” Since then, São Paulo, referred to by the poet as “my dear palimpsest of no value,” has developed a vibrant cultural scene that stands on par with any major global capital. While it’s not accurate to directly credit the Week with this cultural evolution, it’s clear that the city’s complex urban culture is of immense value.
Thus, conceptualizing a monument in the traditional sense—as a symbol of power or a static memorial—would be misguided. The public, collective, and provocative spirit of the Week (and its ongoing impact) calls for a monument without a base, one that encourages interaction and embraces the “contribution of all errors” through diverse artistic expressions like dance, theater, and performances.
The design envisions a 45 by 45 centimeter cross-section reinforced concrete prism, extending 100 meters in length. This prism is segmented into 14 parts, ranging from 14 to 4 meters. The segments are stacked to create a structure that integrates with the terrain, responding to the topography and highlighting the surrounding visual elements (Franz Weissmann). The installation features two main orientations: one directed towards Praça das Artes and the other towards the Post Office building, symbolically reconstructing the intersection of Avenida São João and Rua Formosa. The work does not represent any figurative imagery but exists as an aesthetic entity, open to interactive engagement (Lygia Clark and Hélio Oiticica). It is suggested to paint the concrete red and inscribe verses from Pauliceia Desvairada on the larger segments, emphasizing its role as a concrete, pop-concrete piece (Augusto de Campos, Rubens Gerchman)—a vision that seemed to resonate back in February 1922.
autores authors: Alexandre Hector Benoit, Maria Cau Levy, Guilherme Tanaka
projeto técnico technical design: Helena Cavalheiro
produção executiva executive production: Paula Marujo Ibrahim
fotos photos: Marina Schiesari
ilustrações ilustrations: Vitor Araújo